quarta-feira, 20 de julho de 2011

FACEBOOK MILHÕES DE AMIGOS E UMA ESTANTE

Então, hoje é dia do amigo e recebi várias mensagens de felicitações. Pensei: sou um camarada popular... são seiscentos e tantos amigos, contatos, possibilidades. Enfim, um monte de gente sorrindo, trocando afinidades. Bem, verdade seja dita: a rede é o superdimensionamento. Nem conheço esse monte de pessoas mesmo. Tá, tá certo, tem uma banda feissebuqueiros que compartilha do mesmo interesse que o meu. Tem outra banda que de fato eu conheço. Tem mais meia dúzia que eu gostaria de conhecer e outros tantos que já não adcionei porque não me dizem nada que valha.

No dia de hoje vi algumas pérolas entre as várias felicitações: "Amigos, conto nos dedos e este abraço vai para você...", "Feliz quem tem amigos...", "Se você é meu amigo, me dê 5 contos..." " Eu quero ter 1 milhão de amigos e pedir 1 real a cada um..." e por aí a fora.

Eu mesmo dei um presente no dia do amigo, uma bárbara estante para guardar livros. O detalhe é que não sabia como me desfazer dela e por sugestão da minha super-gente-fina-enteada, coloquei a foto e anunciei a doação, o presente. 0800 todo mundo quer, né? Ainda mais se for de qualidade, coisa boa. Monte de gente me adicionou. Outros sumidões apareceram: Aí Flavito, tá com uma estante por aí... Até o camarada que ficou de me devolver uma televisão há séculos resolveu dar o ar da graça e a jacarandice dura de me perguntar se podia levar a estante...

É! a estante já foi devidamente presenteada. O felizardo parou a kombi e a levou e ganhei 20 amigos novos no facebook. Bom é isso daí... post nada de mais...

 

terça-feira, 5 de julho de 2011

A Myrian dos meus doze anos

Ai Myrian, Myrianzinha, minha Myrian dos meus 12 anos... que saudades, infinitas. Milhares de saudades daqueles tempos juvenis de me fechar no quarto e no banheiro e folhear aquela revista Playboy que te trazia meninamente linda na capa. Como me esquecer?

Como esquecer também da minha vó e seu constrangimento ao me flagrar quando eu deixei a porta do quarto destrancada. Ela não fez nenhum comentário, simplesmente fechou a porta. Mas bastou apenas um dia, uma manhã em que estava na escola para minhas revistas desaparecerem. Que infelicidade Myrian, você nem imagina. Eu e sua foto nunca mais nos vimos. Sabe, fiquei muito triste. Você era uma de minhas musas, sempre ali bela, de calcinhas e lingerie, bela e fogosa. Foi um milagre conseguir sua revista, já que o seu Rei comprara todos os exemplares para retirar de circulação. Não queria, suponho, que ninguém ousasse descascar a marreta pensando em você, nem os caras da turma, nem as meninas do velcro colado.

Talvez por isso, hoje, tenho preferências por mulheres. Talvez por isso, também, as meninas que gostam de meninas passaram a gostar mais ainda. Tudo culpa sua Myrian, minha imaculada Myriam, Virgíssima Myriam. Na verdade você não deveria ter posado nua para aquela revista. Mas posou e eu pousei levemente a mão em um exemplar e agarrei com firmeza.

Hoje sou diferente, acredito. Não deveria haver revistas com nudez à venda em nenhuma banca do Brasil, quiçá no mundo. Porque assim, sabe, essas revistas podem definir o futuro do sexo das pessoas. Aliás, devo dizer, devemos ter cuidado com quem colocamos para trabalhar em casa... eles podem desorientar nossos niños queridos, devo dizer. Também devemos ter cuidado em dar descarga com a tampa aberta pois há bactérias e risco de contaminação, temos que ter muito cuidado, mas muito cuidado mesmo, com tudo. Eu até que me descuidei recentemente, tive uma recaída, uma coisa demoníaca... me expus aos vírus e fui caçar uma imagenzinha sua na internet. Queria postar aqui na net, mas sumiu estranhamente.

Mas Myrian, afora toda a ironia acima, devo dizer... você era linda, cheia de vida, uma belezura, isso nas aparências... porque me pergunto: será que sua inteligência acompanhava (e acompanha) sua beleza física? Creio que não, mesmo que você invista em várias explicações, que retire suas imagens da net, foi muito deselegante seu fetiche explícito de motorista passando a marcha nos filhos da classe média-alta (já viu se pobre vai ter motorista).

Além, Myrian, chega dessa história de dizer que você tem direito de escolha... Esse tipo de afirmação é estúpida e homofóbica sim. Direito de escolha agora todos temos. Quem não tinha direito de escolha eram as pessoas que não podiam declarar legalmente suas afinidades sexuais, apenas na informalidade. E é isso do que se trata a questão. Nem ligo a mínima se seus filhos vão ser seduzidos por motoristas ou empregados, tô nem aí. Agora, se seu preconceito é tão sintomático assim, tome um remedinho Myrian, minha Myrian,  e volta a ser aquela que se enrolava cheia de óleo nos lençóis da minha cama. Ah que saudades...

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Aniversários

Chega o momento de assoprar as velinhas! E parece até que uma letra "h" entra por ali entre o "l" e o "i" - pequena paródia - para nos deixar sempre um pouco mais velhinho. Mas com a idade vem a tal da maturidade, e o que é peso transforma-se em leveza. Assim, vem  os aniversários: cada vez mais leves.

Inda me lembro vivamente do meu ser rebelde e não o desprezo. Realmente durante muitos anos "bati de frente com tudo, contra todos", era a tal da insatisfação: do ter que ser do meu modo. Digamos que isso me foi muito bom, afinal, a sensibilidade aguça-se durante os questionamentos. Entretanto, também há os revezes de tamanha inconformidade. Por exemplo, durante tempos dei pouca atenção para minha carteira, para acordar cedo, para estudar com afinco, para ver a vida em sentido mais horizontal mesmo. Era como o Romário, o que interessava era fazer o gol, bola na rede. Não que isso fosse ruim ou desprezível, era como tinha de ser, mas por conta disso levei anos para me graduar e me perdi em tono de questões mil, do gênero: isto não quero e muito não sei...

A vida é efêmera, passa rápido e é nela que me concentro, que invisto para o mundo seja melhor, tanto para mim quanto para você que me lê (já que não escrevo esse monte de coisas à toa. Acredito que você lerá e que me levará em conta) Portanto: zebra para a infelicidade, para o desconforto e viva este meu aniversário e a beleza de desfrutar de um tempo chuvoso e nublado, assim como desfrutamos de um sol maravilhoso na praia do Leme.

Agradeço muito o pessoal das redes que me postaram felicitações. Foi bacana. Alô Cabral, vê se toma jeito hein... Tô de olho em você. Alô Mirian.... Não seja homofóbica. O PRÓXIMO POST é sobre a homofobia...

   

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Divagações

Sinceramente, acho que já cansei metade das pessoas que passam por aqui com esse vai e vem de postagens. Digamos que é assim mesmo esse meu processo de escrita. Descrevo: levo tempos sem escrever uma palavrinha sequer por aqui e em outros momentos desembesto a escrever. Será mais um momento desse?

quarta-feira, 29 de junho de 2011

in Realengo: Poetas pedem paz

Verbo Paz



Puxem uma cortina, por favor,
que tape este vermelho na janela.
Professor, por favor, me ensine:
quero conjugar o verbo PAZ.

Se no alto do céu eu olhar, agora,
este pátio e ver nele várias asas desenhadas,
minha escola vai ser vida, a gramática
é flor, o sonho azul é futuro
e futuro não chora.

Mamãe, um abraço
no meu bracinho
Papai, aqui pazestou,
pazexisto.

Daqui vejo o vovô, a vovó, a titia.
Vejo também meus amigos.
Aqui tem escola, bola, alento.
Por isso não chore, não me chame:
Criança de Realengo.

Voa a vida, passa o dia,
passa a noite e aprendo:
o verbo PAZ, já sou PAZ.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Cidade Atravessa 9 - fotos

O evento poético Cidade Atravessa é promovido pela Confraria do Vento, este último foi o nono. A novidade consiste no formato internacional, já que o evento ocorrerá em três cidades (Rio de Janeiro, São Paulo, Lisboa). 

A primeira soirée já rolou aqui pela cidade maravilhosa. A convite de Márcio-Andre, Ronaldo Ferrito e Victor Paez, tive o prazer de recitar alguns poemas para o público presente. Recitei nove poemas, sendo que um do livro Poemas Suíços e outros oito poemas (alguns inéditos e outros que já publiquei em revistas). Já fazia uns quatro anos que não me apresentava em público, foi bacana, apesar da garganta estar um pouco enferrujada, travando em alguns versos. Há qualidade poética da noite foi remarcável, pois todos os poetas que se apresentaram diante de uma platéia exigente de bons poemas, apresentaram obras de qualidade, bons poemas. 









sexta-feira, 25 de março de 2011

Cidade Atravessa


Me convidaram, estou lá!!!


SERVIÇO:

CIDADE ATRAVESSA 2011

No dia da mentira, evento de verdade na Travessa 1 inicia série mensal que acontecerá em três cidades do mundo.
 
No dia 1º de abril, às 18h, acontecerá o “Cidade aTravessa 9”, no Rio de Janeiro, abrindo o segundo ano da série mensal de eventos. Além de entrevista aberta com Jorge Mautner e Affonso Romano de Sant'Anna, haverá performances de Andre Vallias e Roberto Corrêa dos Santos, leitura de Evando Nascimento, Paulo Ferraz, Flavio Corrêa de Mello e da inglesa Sophie Lewis e a exibição do filme Totem, de Donny Correia.

Com curadoria dos escritores Márcio-André, Victor Paes e Ronaldo Ferrito, o “Cidade aTravessa: poesia dos lugares” teve, no ano passado, oito edições, atravessando São Paulo e Rio de Janeiro. Contou com a presença dos nômades Fausto Fawcett, Geraldo Carneiro, E. M. de Melo e Castro, Frederico Barbosa, Ítalo Moriconi, entre outros, tornando-se ponto de encontro para escritores, performers, poetas sonoros e cineastas que experimentam a poesia. Tudo regado a absinto, bebida que se tornou símbolo do evento.

Em 2011, o evento revezará entre as cidades de Lisboa (Casa Fernando Pessoa), São Paulo (Casa das Rosas) e Rio de Janeiro (Livraria da Travessa 1), com transmissão ao vivo pelo site http://www.confrariadovento.com/cidadeatravessa.htm. Entre alguns dos que atravessarão essas cidades, estão Antônio Cícero, Gonçalo M. Tavares, João Gilberto Noll, Nei Lopes, José Kozer (Cuba), Enzo Minarelli (Itália), Henri Deluy (França) e Arjen Duiker (Holanda).



quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

ENTREVISTA - SOLANO GUEDES

Solano Guedes é carioca e pai da simpática Sofia. Poeta. Estuda ARTES na Uerj e desde meados do ano 2000 intervém culturalmente na cidade carioca, já participou de mostras no Circo Voador e no Santa Teresa de Portas Abertas. Como escritor publicou um livro infantil pela Vieira & Lent Casa Editorial, a História dos três pontinhos. Escreve no blog Solano Guedes. E promete, ainda para 2011, a publicação de mais um título destinado ao público infantil.


Solano, você pode nos falar um pouco sobre a História dos três pontinhos?



Bom, Flávio, o livro fala de trajetórias e escolhas. A História dos Três Pontinhos é a tentativa de através de uma metáfora organizada no sentido de representar o mundo no ambiente da língua, utilizar como personagens elementos gráficos dessa mesma língua para discutir questões humanas básicas e comuns. Então, os pontos são os personagens principais da história, e cada um deles vai seguir um caminho diferente a partir de escolhas feitas, como acontece na vida de qualquer pessoa.

O fato é que um dos pontos em determinado momento se vê sozinho. Essa personagem que vai ser o fio condutor de uma narrativa que tenta mostrar a importância de uma busca, várias coisas acontecem a esse ponto, ele vai passar por uma série de situações, vai assumir várias funções, vai enfrentar dificuldades, enfim, vai viver... e o livro tenta de alguma forma estimular o questionamento em relação a vida e às relações de trabalho e convivência, sem fechar nada, não é à toa que eu termino o livro com uma pergunta...









Como surgiu a idéia para a História, para o livro?



Eu fazia um curso de design, e o trabalho final era fazer um livro. Eu passei sufoco, não sabia o que fazer e não queria entregar um trabalho qualquer. Uma tarde eu estava num bar que frequentei muito alí na São Salvador, peguei papel guardanapo e pumba! e de repente estava eu às voltas com pontos e letras criando uma história com vida própria, eu escrevia e me lembro de ter a sensação de estar apenas escrevendo algo que já estava pronto, não me lembro de maturar a idéia não, foi algo assim zapt! E tava pronto, claro que depois eu tive muito trabalho editando o material, mas o grosso estava alí, no guardanapo.depois trabalhei dois anos em cima do projeto gráfico e das ilustrações finais.

Demorei para publicar, escrevi aos 19 e só fui publicado aos 29, o livro dormiu muito tempo comigo, mas sempre soube que alí estava uma boa idéia e bem acabada, gosto muito do livro, gosto de tê-lo escrito. A editora matou a charada, o livro fala de felicidade, de busca por felicidade.


Há alguma identificação com algum ponto específico?


Eu me identifico muito com o asterisco, o ponto diferentão que vive fora do contexto... é inegável, mas a arrogância do ponto final também foi minha muitas vezes, e eu também tive o meu Dr.Q. Todos os pontos estão em mim de algum modo e a trajetória do protagonista tem a ver com a minha também, literatura pra mim é algo feito de muito pouca literatura e sim de muita vivência. Quando escrevi o livro eu era um rapazola, hoje vivi mais e posso perceber o quanto me identifico com o livro, sim, há muitas identificações, principalmente quanto à busca de cada ponto pela felicidade. Também busco isso. 



Qual a sua relação entre artes plásticas e literatura?


Na verdade minha matéria prima é a poesia, seja escrita ou falada, sempre a vivida. Do poema eu vou ao texto e posso ir ou não ao trabalho plástico. Eu estruturo meu pensamento na palavra, sempre há texto no que crio, no blog que mantenho há muito texto e vídeos onde o texto é a base, assim como na música, minha parte é a letra, a palavra é minha ferramenta e palavra pode falar de arte como de engenharia naval, palavra é coringa...





Seu livro teve excelente receptividade com os professores de Língua portuguesa e com as redes públicas de educação, de alguma forma você esperava que isso fosse acontecer? e que sensação lhe dá o fato de saber que ele está sendo trabalhado em sala de aula?



Em primeiro lugar fico muito grato aos professores. Muito mesmo. Ao escrever um livro eu não sei exatamente como esse livro vai, para onde vai, como será trabalhado...eu tenho talvez uma idéia, mas é só uma idéia, talvez tenha também uma intenção ao escrever mas não "espero algo" do livro, não espero que nada aconteça, eu simplesmente me concentro em escrever, em acabar o trabalho. Isso quando escrevo, ao escrever. Mas é claro que depois, olhando para o livro, percebi sim  que havia um potencial paradidático ali e fico muito feliz de ver A História dos Três Pontinhos nas escolas, com os professores, me sinto útil, e isso acaba me ajudando muito. Não sei se arte tem que ter utilidade ou não, mas um livro certamente deve se preocupar com isso.



Há algo de novo vindo por aí?


O blog http://solanoguedes.blogspot.com está me servindo de casa na rede, muita coisa nova lá, texto adulto, trabalhos plásticos, vídeos, fotos e desenhos. Este ano sai A Revolta das Vogais, pela Vieira e Lent Casa Ediitorial também, sem data certa ainda. É um livro que fala de minorias e maiorias es suas implicações, usando a metáfora do alfabeto, nele as vogais se revoltam contra as consoantes e isso acaba dando em muita confusão, confiram o poder da "bomba hiatômica"!




sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Aqui não é lugar para os fracos

Aqui não é lugar para os fracos.
Sentimos tua dor como nossa dor
e esperamos o teu sorriso como nosso sorriso,
mesmo amarelecido, enquanto ainda supura
o corpo nos abraçamos para que o suor,
a lágrima e o barulho passem.

Aqui não é lugar para os fracos. Volte,
volte todos os dias. Se a cadeira é tua
a sorte é nossa, meu amigo, apenas volte
para que eu me salve nesta noite.

Ouvi um grito lá fora, um lamúrio esquisito
um nome desconhecido. Ouvi um demônio
me chamando para ver a pólvora
de um 38 com gosto de mármore, de melhoral.
É um diagnóstico desconhecido:
diarréia contínua, olhos esbugalhados.

Aqui não é lugar para os fracos. Aqui,
meu amigo, o que se fala aqui se deita,
se morre, se esquece e se dorme para
acordar no dia seguinte e repetir
o novelo, a linha tênue que nos une,
meu amigo, sofrido amigo, sentinela
com asas cortadas em pleno vôo.

Assim, você feio e desdentado,
desiludido, encarnado, assim você,
você me diz que o mais será revelado,
pois aqui é o lugar dos tortos, aqui
e agora, e hoje, apenas hoje.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

MAÇARICO




Meio-dia: a pele tosta, o suor escorre pela testa.O asfalto fumega azul escuro, cinza, granito e Hades senta-se ao meu lado cuspindo labaredas de álcool. Sua barba vermelha é encoberta de lavas. Já não penso, não sinto, já não ouço os sinos de São Sebastião. Nesta manha de janeiro, a única esperança é que o mar engula a cidade num único gole [ que Deus não me ouça ] ou que o sundown seja o meu manto para me proteger. É hora de fugir, de escavar um buraco e me enfiar debaixo da terra e como um caranguejo, tentar cutelar as barbas de Hades para que ele me deixe.

Duas horas: maçaricos espocam raios nas ruas do Leme. Hades passeia grandioso de Madureira ao Centro. O homem da barraca já não vem mais me oferecer uma água, debaixo de seu sombreirito ele não consegue levantar a vista e ver adiante o horizonte. Ademais, me sinto rendido e prostrado, quase perto do derretimento completo de minhas células. Tenho apenas uma constatação: em pouco tempo serei as cinzas de sunshine. 

Quatro horas: parece que Deus ouviu os grunhidos de uma população suarenta. O céu escureceu mais, acredito, muito mais que no dia do descanso final, e salivas enormes jorraram das nuvens. Em meia hora já consegui colocar meu barco feito de cangas para surfar junto com os ratos pelas ruas do Rio de Janeiro, agora Rio Dilúvio, Rio Movediço.

Seis horas: Com sorvete de creme com chantilly e de banho tomado, assisto na televisão as calamidades. Hades sossegou. O novo vilão da rede globo chama-se São Pedro, codinome desequilíbrio climático. Teresópolis sofre, suas mães choram e seus pais rasgam unhas desesperadamente enquanto escavam a terra a procura de seus entes. 

Oito horas: coloco a sunga atrás da geladeira. Beijo a minha mulher na testa e me pergunto se teremos filhos. Por dentro, me sinto um maçarico vivo.
   

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

REVISTA ESTUÁRIOS - e nº 0

Bem vindos à revista quinzenal ESTUÁRIOS - e. A proposta deste periódico virtual é a publicação de artigos, poemas, crônicas, pictórias e videos, que de alguma maneira chamou, chamam e chamarão a atenção deste blogueiro. O foco editorial é livre, ambivalente, e torço para que reserve algumas surpresas para os visitantes. Não se trata de um noticiário, nem de um relicário das minhas impressões internéticas, mas o escopo flui conforme meu espírito, algumas linhas de afinidades estéticas e ideológicas serão privilegiadas: artes plásticas, literatura, política e o futebol fazem parte da salada.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------






Escultura de Jorge Gassetti


POEMAS

"a lágrima"

Adriano Nunes
[ in que faço com o que não faço ]

depois
nós dois
perdemos
os remos
e o cio...

não era
a esfera
aquática,
temática
do rio.

o rio
não era,
a fera
das margens,
vazio.

"falta"
Romério Rômulo


eu não tenho uma casa
nem um cabelo bonito
a minha falta de asa
é que me faz esquisito.


"o moço"
Moacyr Sacramento.

Não me perguntem quantos anos tenho;
e sim, quantas cartas mandei e recebi.

Se mais jovem, se mais velho...
o que importa,  se ainda sou um fervilhar de sonhos,
se não carrego o fardo da esperança morta!

Não me perguntem quantos anos tenho;
e sim, quantos beijos troquei - Beijos de amor!

Se a juventude em mim ainda é festa,
se aproveito de tudo a cada instante
e se eu bebo da taça gota a gota...
Ora! Então pouco se me dá que gota resta!

Não me perguntem quantos anos tenho
mas... queiram saber de mim se criei filhos,
queiram saber de mim que obras eu fiz,
queiram saber de mim que amigos tenho
e se a alguém, pude eu, tornar feliz.

Não me perguntem quantos anos tenho
mas...queiram saber de mim que livros li,
queiram saber de mim por onde andei,
queiram saber de mim quantas histórias,
quantos versos ouvi, quantos cantei.

E assim, somente assim, todos vocês,
por mais brancos que estejam meus cabelos,
por mais rugas que vejam no meu rosto,
terão vontade de chamar-me: O MOÇO!

E ao me verem passar aqui... ali...
não saberão ao certo minha idade,
mas saberão, por certo, que eu vivi!


PROSA

"Vegetativo"
Roberta Mendes
[in Palavra em fuga]


O dia gastou-me até o caroço de mim. O tempo e suas mandíbulas de ponteiros roeram-me ainda o hermético núcleo, empurrando-me contra o duro palato, para, então, girar-me contra a língua espessa das horas à cata de alguma sobra nas reentrâncias. Julgando que me esgotara, deitou-me fora, farejando os restos com o desdém dos cães às tigelas vazias.

...Mas o caroço é a astúcia das coisas, resguardando-se...

Partisse-me o grão, aí sim, mordia-me em cheio o ser. Na porção-grão irredutível de mim, germino a lenta reinvenção da força. Afinal, a palavra de ordem de toda semente é vingar.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Gatos, ratos.
Eloíse Porto

É da natureza do gato caçar o rato.

Condição inexorável de jogadas perversas de caça e abate da presa.

A cozinha era um tanto asséptica. Um tanto limpa e organizada, nada caótica, arejada e moderna. Poucos móveis, nada surpreendentes, um tanto baixos. Geladeira demasiado pequena, pequena de poucas coisas, nada feito ali, algumas embalagens de comidas prontas já reviradas. A geladeira era bastante antiga, meio steam punk – não por moda, mas por herança ela servia ali. As paredes com metade de azulejo imaculadas de brancas – um fina camada de poeira quase imperceptível, meio poeira, meio névoa, não deixava claro há quanto tempo o ambiente não era limpo ou se o ambiente era de fato real, perceptível de mesma maneira para todos.

Um cômodo retangular e iluminado. Estranhamente iluminado. O sol banhava todas as manhãs e algo ali mantinha aquele calor. Não tinha planta. Nem toalhas, paninhos. Tudo madeira branca e metal. Um pequeno fogão. Algumas prateleiras.

De todo ambiente, era o chão que se destacava. Ligeiramente mais alto, lembrava levemente um palco para algo que jamais seria encenado, ou, num outro ângulo, lembrava a todos que tudo é justamente encenação o tempo todo. O fato que o chão era palco, ali o simples cair do macarrão soprava irrealidades. Como no dia em que, de fato, um pouco de espaguete com molho vermelho caiu sobre ele, e a mancha escarlate sobre o palco, ou sobre o chão, causava o incômodo do sangue na arena. A mancha secava angustiadamente, e por pouco não sai – como se o sangue fizesse parte da própria arena, para nos lembrar que não existe morte sem sangue, para nos lembrar que o sangue faz parte da arena e nada pode tirá-lo de lá.

De todo ambiente, era o chão que se destacava. Ligeiramente elegante, era uma composição quase pós-guerra, anos dourados, anos 50. Preto e branco. Conservado, ou novo – impossível dizer. Quadrados pretos intercalados de brancos. Preto branco preto branco do lado e em cima, formavam um tapete, um puzzle – melhor, um tabuleiro de xadrez, com diferentes peças que se moviam aleatoriamente. Bebiam água. A comida. Há palavras. Ou não tão aleatoriamente.

Nisso, era o gato que buscava de novo a presa.

Mas não sem divertir-se primeiro.

Ele pressente o cheiro de longe. Nessa hora, a alma só sorri, se é que a alma existe. O primeiro cheiro é o início da caçada, do prazer e da morte.

Mais macio do que a sombra, ele torce o pescoço em direção ao rato. Pequeno, frágil, cheio de pudores, de constante medo de tudo que não conhece, medo da própria condição de pequenez, medo de tudo que é maior, medo dele próprio. O rato, só medos. Medo, acima de tudo, de encontrar algo que o perturbe, que o ameace...

É o cheiro do medo que o gato sente. Isso torna a caçada melhor, mais interessante, mais cruel. É dessa forma que ele vê o mundo, é da sua natureza. Num sacudir de pelos, ele percorre a cozinha, um tanto asséptica, mas não tanto, e vê o pequeno camundongo aventurando-se da área de serviço, provavelmente, por onde entrou, pois lá existe uma imensa janela de luz que sempre fica aberta, para o armário de comida, um móvel baixo, nada surpreendente, bastante sóbrio e ao mesmo tempo tentador. O rato enlouquece ao perceber a presença do mal, tonto entre o faro da comida e o pressentimento do aniquilamento e da tortura, ora, tortura – achar comida e abdicar dela ou arriscar-se no blefe e perder a mão? A vida era a arte da eterna tortura... do não ter, do não querer e não poder, a tortura era a arte do não a si próprio.

O gato – nem tão grande, mas bem esperto! – sente a hesitação de segundos e quase pressente o sangue do outro dando voltas e voltas e voltas... e seu coração dispara, era a hora da caça, não podia ser outra, o que faria primeiro, deixaria ele fugir para pegar depois, e se ele fugisse de fato, melhor era então matá-lo a unhadas, mas que prazer existe em abater a presa assim tão facilmente, o que poderia ser, em última instância, a natureza da caça, ou o prazer dela? O que era prazer para um era caçar, e nesse jogo a outra ponta do prazer era o da caça, que tinha medo do abate mas amava, estranhamente, a ideia de fugir. E se a caça acabasse? Como um poderia ter poder e o outro poderia ter a possibilidade de fuga, de triunfo? Os dois só pensavam no próprio triunfo... no prazer do triunfo e na possibilidade da morte. A vida era a arte das possibilidades de vitória ... ou não.

O felino mexeu-se de uma só vez, num bote rápido, mas não tão rápido que pudesse tirar qualquer possibilidade de reação, de maneira que o rato escapa sobre aquele complexo tabuleiro de xadrez para o pequeno esconderijo entre a parede e a máquina de lavar.

Esse era o entreato.

Ali ficou o rato, entre a parede e a máquina de lavar, o cheiro da comida e o predador.

Talvez minutos, talvez horas. Ali, também valia a paciência. Os dois sabiam disso.

O gato espera.



VÍDEO - MÚSICA

Música - Último desejo (Noel Rosa) interpretada por Pedro de Quinane.
videomaker: Carlos Alberto Cunha Bastos







terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Os 13 evangélicos

Enquanto escrevo estas linhas, meus vizinhos dão Glória a Deus e Aleluia!! Todas as terças é o mesmo rosário. Antes de mais nada, eu já aviso aos sobressaltados que eu não tenho nada contra religiões, sou inclusive, um religioso. Entretanto, não posso me abster de achar um saco ter 13 vizinhos que moram em um apartamento de 3 quartos e resolvem deliberar em voz alta seu amor ao Cristo da maneira que eles O compreendem.

Não podem orar em silêncio ou pelo menos em voz baixa? Não podem realizar suas libações na igreja? Bem, devo dizer, que a maneira que eu compreendo a religião, o poder superior, é bem diversa da deles, e de forma respeitosa eu não pratico ou brado meu credo a outros, pois entendo minha intimidade religiosa, minha centelha divina é respeitadora. Por conta disso, ainda não criei quizumba com meus vizinhos. 

Na verdade seria maravilhoso se meus vizinhos conseguissem escutar Deus no silêncio. Seria maravilhoso se eu pudesse escutar Deus no silêncio, me falando que um dia isso passa, isso muda. 

Por outro lado meu ser pensador diz que o ideal é a reunião do condomínio, é o caminho da legalidade. Uma carta condominial para os vizinhos, sanções com multas também funcionam. Alguma coisa precisa ser feita... Pois assim, com tantos glória a Deus os poemas que dançam na minha cabeça não vão ser escritos.

Silêncio por favor!      

domingo, 2 de janeiro de 2011

Despedidas

O Rio de Janeiro 11 horas
o céu vermelho lá fora
o que é? que será?

Assobio meu desejo,
o grito escrutínio, lamúrio,
riso que ouço da minha vizinha chata
(muito chata).

Rocinha se ilumina. Salto sete andares,
sete compassos do Jorge Benjor,
os sete anos que morri
(meu pensamento confuso todos dias).

Salto o cinema, o canal TCM,
a novela e assalto e assisto
tua mão estendida e submersa
numa piscina verde
borbulhando frases de msn
com sotaque inglês:

Dilma se elegeu... Alencar
não morreu... ainda... ainda...
Open your eyes aparece na tela,
uivam as visões, 2011 chegou.

sábado, 1 de janeiro de 2011

1º de Janeiro

43 minutos se passaram, agora é o dia 2 de 2011. Há 89 anos e 43 minutos nascia minha vó. Lá em Bigas, Portugal, numa casa geminada de pé direito alto. A frente era a porta e a janela, ambas em arco. De um lado da rua as casas, de outro um campo vasto. Assim eu recordo 10 anos depois de ter visitado Bigas, 10 anos depois com esse acúmulo de raciocínios, de pensamentos, de vazios.

Hoje enquanto estendia umas roupas no varal bateu uma saudade da minha vovó. Hoje minha complexidade me permite sentir saudades de alguém para além das saudades que eu senti quando visitei a fachada onde ela nasceu.

Esse meu cérebro é um arrazoado de memórias. Permanecem frações, átimos. Mas as sensações atualmente se multiplicam. Verdades, sensações verdadeiras me povoam, como a saudade, a saudade porra! E assim vou vivendo.