Um índice para a “utilidade editorial” é recordar os nomes revelados ou defendidos por ela. Um editor deve “satisfazer” ao gosto do público numa percentagem de 98%. E deixar dois por cento, para atender ao gosto de quem não é público nem pensa por números de maioria, nem obedece ao imperativo de ir-na-corrente nem passivamente repetir o gosto-porque-todos-gostam. Não é possível dar sempre chocolates ao bebê chorão e guloso...
Portfólio / Curricullum
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
O Editor Independente - Luís da Câmara Cascudo
Um índice para a “utilidade editorial” é recordar os nomes revelados ou defendidos por ela. Um editor deve “satisfazer” ao gosto do público numa percentagem de 98%. E deixar dois por cento, para atender ao gosto de quem não é público nem pensa por números de maioria, nem obedece ao imperativo de ir-na-corrente nem passivamente repetir o gosto-porque-todos-gostam. Não é possível dar sempre chocolates ao bebê chorão e guloso...
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
A tela colorida
domingo, 11 de outubro de 2009
Poema de pausa
quatro dias
e quatro vezes
que me sento
para espantar
o devaneio
deste poema
e o cérebro,
essa metralhadora
contínua não rói
o osso por inteiro.
sábado, 10 de outubro de 2009
ROTEIRO DE POESIA 2000

domingo, 27 de setembro de 2009
Dia de Chuva
sábado, 5 de setembro de 2009
do diário de notícias particulares
terça-feira, 1 de setembro de 2009
Lidice
De seus trezentos mortos,
de suas cinzas surge a Fênix.
Olhos angulosos.
Olhos Heil Hitler.
Olhos raios!
pois aqui sobreviemos
e vivemos para além
desta insujeita,
desvária e desvalida
arrogância de tentar
arrastar-nos para verdades
que não compreendemos.
Lidice, fênix e eu,
Flávio, forasteiro e insano,
descuidado e impreciso,
morto e renascido
a cada dia, a cada hora,
só por hoje, só por hoje.
Aquela cidade está por aqui
batendo um vaso sanguíneo
aquela cidade me faz
viver mais, acreditar mais.
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
terça-feira, 18 de agosto de 2009
elementos
o chão de terra
é poeira, lama,
forjando rasteiro
desejo de ser.
Fogo e água,
no ar, na terra,
devaneando
insanos naufrágios
do crescer.
Terra e fogo
no ar, nos pulmões,
é grito afogado
labaredando
a areia de viver.
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
Ouvindo Vozes - Edmar Oliveira

sábado, 8 de agosto de 2009
Nascedouro
na curva, no esterno,
é um regato, uma fonte,
uma goteira que nasce
quando engasga,
cinge a glote e cerra os dentes
sem vida e sem beira
─ mesa de bilhar sem caçapa.
Nasce e finda visgo,
é um desvio que pegamos,
eu e você, sem vermos o fígado,
o rim, o pulmão, as cáries,
sem vermos nada,
cheiros ou sobremesas.
Mas assim nasce, e depois,
depois desanda e desanca
em outro lago que nasce,
nasce e empurra,
afunda e desembrulha
como um doce vômito
emergido de uma bolha
dupla de sentido
e de sentir para aquém
e para além do rio.
quarta-feira, 5 de agosto de 2009
os espelhos
Dois espelhos colados.
Frente e verso. Reversos.
no meio dos dois a cola,
a linha espremida
e sufocada. Ali, nós,
como lençol
grudento de suor,
somos pasta de vidro.
Ali no meio somos amor,
somos no nome
- a essência é o nome.
Se a cola é úmida ou seca,
Se o amor é na cama ou na louça,
somos o diário, o cotidiano
de dois espelhos que roçam,
gripam e espaldam
quando o sol desponta,
quando a rusga aponta.
Esse é o encontro
daquilo que nem
sabemos o quanto
e o como,
o quando e o que se é:
o nome, a força, a constância,
então refletimos, sim
refletimos, apenas isso,
refletimos cada um
seu modo de iluminar
o rosto do outro.
terça-feira, 4 de agosto de 2009
Blog de ouro
Ganhei esse simpático e mui honroso selo da blogueira Tatiana Carlotti. Valeu, muito legal mesmo. Então, a idéia é receber e passar adiante para mais cinco blogueiros. Esta semana está sendo bacana para mim, muito bacana mesmo, pois realizei uma mudança de vulto na minha vida. Além disso, recebi algumas homenagens do universo online: Moacy Cirne publicou um poema meu em seu balaio, Elaine Pauvolid, editora da revista eletrônica Aliás, publicou quatro poemas de minha lavra na edição deste mês, Adriano Nunes me dedicou um soneto maravilhoso e Jandira Rodrigues também escreveu um post-carta para mim. Bom né! São essas singelas relações que nos fazem seguir adiante e perceber o quanto é bom viver, viver com tranquilidade. Não se trata de ego e de vaidade. Trata sim, de reconhecimento, de valor, de amizade. Valeu mesmo.
Aí vão minhas indicações de Blogs de ouro, antes vale ressalvar que quando recebi a homenagem, pensei em repassar para mais de cinco pessoas, entre elas o Henrique Pimenta e o Moacy. Fui lá e percebi que eles já haviam ganho o selo simbólico de qualidade.
1 - Tremaliteratura (comecei a acompanhar este blog coletivo, o grupo escreve a bossa da crônica)
2 - O que faço com o que não faço (blog do Adriano Nunes, o autor publica ótimos sonetos).
3 - Diagnóstico desconhecido (blog do Solano, neste blog você lerá posts geralmente curtos, muito rico em alma).
4 - Para eu parar de me doer (blog de alto nível literário. Percebe-se o trabalho de linguagem, o burilamento. Roberta Mendes e Elis fazem do blog um sortimento de literatura, crítica de cinema e, repito, alto nível de escrita).
5 - Miscelâneas e tonterias da Jandira (o blog é meu porto seguro. Geralmente, agora menos, é a pessoa que lê meus textos antes de mim mesmo).
Bem aí estão minhas indicaçõe. Como disse, muitos outros blogueiros poderiam estar aí, fica para a próxima. Peço desculpas aos blogueiros (as) que, pelo instante não entraram na lista. Não fui eu que propus a regra, mas se tá aí vou seguir. É... Hoje estou assim. Vou seguindo... Sigo o cortejo e não pergunto pelo nome do defunto no caixão.
sexta-feira, 31 de julho de 2009
LAMAÇAL
na emergência das febres,
nas veias expostas, rompidas,
lá na boca do vulcão
ou do que se assemelha ao vulcão,
mas que também pode ser ânus ou furacão,
lá, a lira ventilou a luxúria e o álcool,
os sonhos canhotos, as frituras canhestras
e a fissura ungida por fina camada de vaselina.
Movimento retorcido, jogo de cimitarras,
brados e bólides assassinos,
fricção cáustica e chamuscada,
angústia nauseada,
meteoro e morteiro
e tudo que arremata e arreda,
e leva o pó ao fim,
ao ermo com garras e rezas.
A Terra é de lama e de pó
e a lira canta o chumbo
de crianças mortas.
O verso então redobrado
retorna à espinha e retoma
a forja da vida,
o sedimento do sangue.
quarta-feira, 29 de julho de 2009
PAIXÃO E POEMA
dedica versos e livros
para mulheres que comovem
e movem na impossibilidade
da matéria e no reverso
do espelho o beijo
tem cores para cores
e superfícies para desníveis.
É um ser em profunda
profusão dos amores mortos
e não ama e incompreendido
confunde e co-funde
imagens e mistura a sintaxe
e vagueia na ortografia
e deixa espólio
fugaz e rápido
de poesia mal
capturada.
segunda-feira, 27 de julho de 2009
as caixas
sexta-feira, 24 de julho de 2009
Leo Marona - Pequenas biografias não-autorizadas

Duas palavras escritas por Abujamra na orelha do livro Pequenas biografias não-autorizadas (7Letras, 2009), de Leo Marona, me chamaram a atenção: avalanche e fecundidade. Há outras que podem se conectar no mesmo campo semântico: confissão e jorro. E na poética do autor estas palavras adquirem valor de combustão, são pistões propulsores que ditam o andamento do livro. A divisão do sumário em duas partes elide a uma referência cronológica. Correspondem também a um tempo poético de descoberta de afetos e de gostos. Assim, as avalanches fecundam versos sobre o que o poeta sorve no seu cotidiano e que constituem suas biografias não autorizadas (Rilke, Cortázar, Antonioni, Descartes, entre outros...).
Na poesia de Marona o ritmo é emblema motriz, vitalidade. Sobrepõe paradoxalmente a escolha de uma estética morfossintática. A frase melódica implícita nos versos não se apresenta isolada, mas sim constituindo um Todo em cada poema, dividindo-se em núcleos distintos, em blocos de sentidos que complementam o valor de unidade dos poemas e por conseqüência da obra, como no poema Roçam-se os pés, no qual há um enlaçamento do ritmo do poema e a imagem de um cadenciamento dos pés através de rimas continuadas:
"acho que todo mundo / um pouco no fundo / sem saber como / quer o amor / como o fruto / de outro sigilo / secreto defunto / (...) agora é tarde e frio / os cílios se dobram / e existe um certo vazio / que só preenchemos / com calor hesitante / e os pés enlaçados / carregam o instante (...)"
De certo modo, a construção das imagens obedece a alguns critérios: o lirismo pessoalizado, reflexo do momento, é construído em uma sucessão rítmica de imagens. Se o ritmo dita a cadência fluídica, muitas vezes acelerada, o fluxo de imagens alardeia o caráter expansivo do autor, caráter voraz, juvenil, tentando ourivezar seus ímpetos, contidos pela inexorável ação do tempo, como no poema “ vinte e seis”, que debuta a segunda parte do livro:
“um dia, inevitavelmente, aconteceria. / o antigo poeta das linhas apócrifas/ sobre fantasmas internos e naufrágios / o infante terrível / o descabelado, / o vil / sem regras daria lugar ao homem grave, / à besta milenar – homem sem pernas, / meio doce meio amargo meio homem, / a boca sem fim inclinada para baixo, / as leituras eslavas, / a sutura do ódio / que prolifera para dentro em pústulas / e adquire a petulância de um mar parado.”
Poema rico em imagens e alusões. Há acima um rebuliço de nuances tanto de referências poéticas (Pessoa, Homero, Rimbaud), quanto de metáforas da rebeldia que se atenuam em morbidez romântica ( ... à besta milenar – homens sem pernas, / meio doce meio amargo meio homem, / a boca sempre inclinada para baixo, / as leituras eslavas, / a sutura do ódio...). E a idéia do mar regurgitando aceso e que por ordem do tempo (Um dia, inevitavelmente, aconteceria.) se condensa em algo flácido, sem músculos, um mar grave, parado. Ainda assim, há o desejo, a voragem de deglutir o Todo, mesmo consciencioso das etapas do processo do navegar pelos mares da poesia. Esta consciência é dolorida, é creditada aos embates entre o conter, o discernir e o expandir o verbo e o verso. No poema carta a um estudante de belas-artes, por exemplo, Marona realça o tom prosódico com descrições de recomendações poundianas:
"Ezra Pound dizia / nos seus ensaios sobre poesia / que a poesia era uma ciência / assim como química, medicina. / ele acreditava piamente / no ritmo absoluto / de cada ser humano. // nas formas sólidas e fluidas do poema / - como árvore ou água despejada - / concebia a poesia como arte exata / e cada homem como seu próprio poeta em si, / sem diferença entre amadores e profissionais (...)"
A dicção professoral acompanha o poema:
"dizia que não devíamos esperar demais / por ter nosso valor artístico reconhecido / antes de havermos descoberto algo novo. // dizia que devíamos ler os franceses, / sobretudo os gregos, / os florentinos, / que devíamos ler Confúcio inteiro, / Homero inteiro, as versões, / Ovídio e os poetas latinos “pessoais” / Catulo e Propércio. / ele veio do alto e nos disse, pousando: / não percam tempo com o que não presta, / vão direto ao talo do osso primordia!"
Súbito, depois de decantar o receituário, o poema caminha para o corte final: a supressão da direção professoral em prol de uma autonomia rebelde (quero que você, Pound, se foda. / Quero escrever tua poesia austera.), independente e um desejo autofágico de incorporar a poética poundiana em sua essência e não no seu modus operandi. Aí, de certo modo, o poema se apossa de sua liberdade total de criação. Me remeteu muito ao poema Estou com 25, de Gregory Corso, poeta beat, que escreveu os seguintes versos:
"Com o amor minha loucura por Shelley / Chatterton Rimbaud / e a tagalerice-carente dos primeiros anos / já fez correr de um ouvido a outro / EU DETESTO OS VELHOS POETAS ! / Especialmente os velhos poetas que recuam / que consultam outros poetas velhos / que falam de sua juventude em suspiros, / dizendo: ─ eu fiz estes naquela época / mas foi naquela época / foi naquela época ─ / Ah eu faria calar os homens velhos / diria a eles: sou amigo de vocês / o que vocês já foram um dia, através de mim / serão novamente ─ / E depois à noite na intimidade de suas casas / rasgaria suas línguas que só sabem se desculpar / roubando-lhes os poemas."
Esta semelhança de se apossar das outras vozes permeia quase todos as pequenas biografias não-autorizadas. Vemo-las em orangotangos ( herdeiros da poesia enlatada e da urina impura, / colheremos o excremento de mentes inseguras. ), em Whitman ( você tocou o primeiro clarinete de fogo. / deixe-nos sair do fogo, recuperar a casa. ), em Kerouac ( teu erro foi me fazer pular etapas / para chegar mais cedo à tua velhice ... ) Assim, a proposta poética advém da necessidade de reescrever cada influência, cada leitura pertinente, caracterizando-as tanto na sua origem ─ a forma e o conteúdo dos artistas biografados ─ quanto na fusão resultante do encontro entre as biografias e o autor, o Leo Marona.
Talvez o que sintetiza e o que “não” autoriza Marona a tematizar outros artistas seja justamente o seu momento poético de sorver o máximo possível do universo e apresentar-nos esta recolha de poemas. Talvez, seja do seu espírito jovem e índole ter uma voz tão plural, tão rica de nuances e, não se engane, claro leitor, como disse no início do texto, não há ingenuidade, pois os ajustes dos versos demonstram domínio de técnica, mas a que isso serve, se o que importa mesmo é o escrever consigo, para ti, para mim, para Antonioni, Chet Baker, Maiakovski, e tantos outros autorizados ou não.
segunda-feira, 20 de julho de 2009
O recital
sábado, 18 de julho de 2009
A hora de escrever
segunda-feira, 13 de julho de 2009
terça-feira, 7 de julho de 2009
Três poemas de Moacy Cirne

domingo, 28 de junho de 2009
Alguns dilemas, dúvidas, proposições e uma confissão:

quinta-feira, 25 de junho de 2009
Frejat - Quem me olha só
A reprodução pode não ser das melhores, mas este vídeo marcou minha juventude. Era a época do Barão se separando. De certa forma, esta canção simboliza a vocação bluseira de Frejat. É ótima. A letra então, nem se fala
terça-feira, 23 de junho de 2009
Segredos
que de tão fundo se esvai
na saliva de um cachorro,
pela boca, e some num recanto
escondido, algum lugar meu
desconhecido. Mas sinto.
Sinto-o perene, mas firme,
chamuscando minhas mortes
e noites quando deito na cama
e o travesseiro aviva a insônia.
Guardo um segredo, um não!
dois: um é vazio, outro é buraco
no qual afundo, sem passos,
atávico, o passado obtuso
e obtlerado, aquele feito de neve
e gelo, pesado, muito pesado,
que cerziu o fantasma logo
abaixo do cimo do buraco,
um tampo de ilusões.
domingo, 21 de junho de 2009
Boris Vian na tradução de Ruy Proença

quarta-feira, 17 de junho de 2009
AVELLANEDA
Ali está a porta que encerra,
decerto, vozes em suas nódoas
de madeira com a mesma feição
que a garganta resseca a poeira.
Adiante à porta imagina-se o choro
suado e salgado de alguém que diz:
Avellaneda e eu. E que bom seria
se você viesse mais uma vez.
Viesse a última, a única,
por Deus, viesse mais uma vez
riscar meu corpo com o batom
enquanto te beijo de carbono.
Se eu soubesse o que há por lá
por traz desse infinito platão
não seria então tão estático,
duvidoso, de versos sisudos.
Rasgaria sim, rasgaria
os lanhos de madeira com estrondo,
ávido de uns beijos matinais,
de um abraço de sua alma,
agora seca e muda.
sábado, 13 de junho de 2009
O Tempo
um tempo a si mesmo,
aquele da flor florir
da aranha tecer, dê.
Dê um tempo em si mesmo
não urge tomar cicuta todos os dias.
Apenas uma dose, o valete de paus,
ensimesmado, vem assassinar as luas.
Dê, por isso: um tempo
demasiado esticando as costas
desacabrunhando a voz
e desalitando o cansaço,
deixando no passado o asco,
o tempo do se...
Lá dentro mesmo do tempo
que você não deu.
sexta-feira, 12 de junho de 2009
TRADUÇÕES DE JORGE WANDERLEY

I died for beauty
I died for beauty but was scarce
Adjusted in the tomb,
When one who died for truth was lain
In an adjoining room.
He questioned softly why I failed?
“For beauty”, I replied.
“And I for truth, - the two are one;
We brethren are”, he said.
And so, as kinsmen met a night
We talked between the rooms,
Until the moss had reached our lips,
And covered up our names.
Morri pela beleza
Morri pela beleza e mal chegara
A me ajustar ao meu túmulo
Quando alguém, que morreu pela verdade,
Foi estendido ao meu lado.
Suave perguntou porque eu morrera.
“Pela beleza”, eu lhe disse.
“E eu pela verdade – o que é o mesmo;
Somos irmãos”, respondeu.
E assim, como parentes reunidos,
Conversamos noite a dentro
Até que o musgo alcançou os nossos lábios
E recobriu nossos nomes.
Hilda Doolitle
Heat
O wind, rend open the heat.
cut apart the heat,
rend it to tatters.
Fruit cannot drop
through this thick are –
fruit cannot fall in to heat
that presses up and blunts
the point of pears
and rounds the grapes.
Cut the heat –
plough trough it,
turning it on either side
of your path.
Calor
Ó vento, rasga o calor,
secciona o calor,
rasga-o em farrapos.
Os frutos não podem cair
por este ar espesso...
não podem cair no calor
que se opõe e dá forma romba
às pontas das peras
e arredonda as uvas.
Corta o calor...
fende-o,
transforma-o nos dois lados
da tua estrada.
Patricia Hooper
Desert
Where there’s a river
that tastes of direction.
Where there’s on orchard,
that says survival.
Where there’s a desert,
that changes everything,
as if hadn’t wanted
to fill only her own need.
Deserto
Onde existe um rio,
aí se tem um sabor de direção.
Onde existe um pomar,
isto diz - sobrevida.
Onde existe um deserto,
isto muda tudo,
como se a terra não tivesse desejado
suprir apenas suas próprias carências.
quinta-feira, 11 de junho de 2009
Dossiê Ditadura: Mortos e desaparecidos políticos no Brasil (1964 - 1985

Dados de catalogação:
Dossiê Ditadura: mortos e desaparecidos políticos no Brasil (1964-1985)
2ª Edição revista, ampliada e atualizada
Org. Criméia de Almeida, Janaina de Almeida Teles, Suzana K. Lisboa e Maria Amélia Teles
Imprensa Oficial do Estado de São Paulo / Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos / IEVE - Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado
772 páginas R$ 60,00
“Dossiê Ditadura: mortos e desaparecidos políticos no Brasil (1964-1985)” é resultado desse trabalho incansável e sofrido, empreendido por uma comissão de familiares, muitos deles também vítimas da violência. Trata-se de um levantamento exaustivo e abrangente, cuja segunda edição, com incontáveis acréscimos, foi feita pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e IEVE (Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado).
A primeira edição, após quase duas décadas de buscas por informação e algumas versões preliminares, foi publicada em 1995. A luta por esclarecimentos, porém, nunca cessou. Esta nova edição, revista e ampliada, reúne histórias ilustradas de 436 mortos e desaparecidos durante o regime militar. No Brasil, são 396, sendo 237 mortos e 159 desaparecidos políticos --desde a última edição, novas investigações acrescentaram as histórias de 69 pessoas, além de terem ajudado a corrigir várias das versões anteriores.
No exterior, há 30 casos, incluindo mortos em decorrência de seqüelas de tortura ou de acidente no exílio. Há, ainda, 10 pessoas que morreram antes do golpe.
“Algumas pessoas que pensávamos terem sido mortas na rua em tiroteios foram na verdade presas, torturadas e executadas. Lembro que foram 132 casos em que provamos serem mentirosas as versões da ditadura de suicídios, atropelamentos e tiroteios”, afirma uma das quatro responsáveis pela redação final do livro, Suzana Lisboa, ex-guerrilheira cujo marido foi a primeira vítima a ser reconhecida oficialmente, em 1979.
Este número de vítimas ainda não é definitivo. Não foram esgotadas as possibilidades de pesquisa e investigação, como as realizadas nos arquivos do antigo SNI, por exemplo. Nem foi possível, também, o acesso aos arquivos militares. É o que diz Criméia de Almeida, outra das responsáveis pela redação final do livro. Sobrevivente da guerrilha do Araguaia, ela perdeu o marido e o sogro: “Os arquivos nos são sistematicamente negados sob a alegação de que não existem, até mesmo quando ganhamos na justiça esse direito como é o caso do Araguaia, em outubro de 2003. Até hoje a sentença não foi executada”.
Grande parte das informações, segundo ela, foi obtida, direta ou indiretamente, com ajuda dos familiares. “Nossa meta futura é fazer com que os arquivos sejam realmente abertos e o país tenha uma Comissão de Verdade e Justiça que esclareça as circunstâncias em que se deram as mortes e desaparecimentos e puna os responsáveis por tais crimes”.
Ao comparar os dois momentos, o da primeira edição do “Dossiê Ditadura” e o atual, Criméia de Almeida diz que houve avanço, mas “num ritmo muito aquém do que seria necessário ou desejável numa democracia”. Para Suzana Lisboa, o Brasil está muito atrás dos países da América Latina. Desde a última edição, as denúncias aumentaram, vale destacar, porque outros países têm pedido a prisão de agentes do estado brasileiro.
No livro, organizado cronologicamente, cada vítima tem sua história de vida e luta contada. Estão lá membros de partidos, militantes de grupos de esquerda e de movimentos sociais, além de outros que, sem qualquer atividade política, foram mortos “por acaso”, por terem sido confundidos. Existem casos famosos, como o do Capitão Lamarca e Iara Iavelberg, mortos na Bahia no começo dos anos 70, os dos participantes da guerrilha do Araguaia, que resistiram até 1974, e o do jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975. O livro inclui também boxes temáticos que ajudam a contextualizar os crimes e a luta dos familiares, tais como aqueles que tratam do AI-5, do Congresso da UNE em Ibiúna, da Campanha pela Anistia, da Crise dos Desaparecidos de 1975 e das tentativas de criar a CPI da Tortura.
No prefácio à nova edição, o jurista Fábio Konder Comparato lembra que, ao ler qualquer das páginas, é praticamente impossível evitar as lágrimas. Porém, acrescenta ele, a consciência ética deve nos levar além de reações emocionais. Afinal, há várias perguntas que permanecem: “Por que razão tudo isso aconteceu entre nós durante anos, sob o olhar indiferente da maioria esmagadora da população? É decente virar as costas para essa fase ignominiosa da história brasileira, sem se importar com a identificação e a punição dos mandantes, financiadores e executantes de todos os crimes aqui descritos?”, diz.
Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo --e, assim como Konder Comparato, uma das vozes mais ativas na luta pelos direitos humanos--, ressaltava já no prefácio à primeira edição que este livro, “de dor e melancolias”, surgia para “fazer pensar e fazer mudar o que deve ser mudado em favor da vida e da verdade”.
Por meio do site http://www.desaparecidospoliticos.org.br/, mantido pelos familiares, tem sido possível receber informações. Se a redação final contou com quatro pessoas, o levantamento teve –e continua a ter -- a contribuição de incontáveis participantes.
***

sexta-feira, 5 de junho de 2009
LUZES ACESAS
e sobram luzes acesas.
São várias. Pálidas.
Pouso o corpo
em uma fístula
matutina de sol.
Sacode a mente, aninha
a ambrosina que serelepe
me aquece de um frio
quase invernal.
Mas o tempo,
o tempo presente
nestes poemas
não são luminosos,
tão pouco contém
espuma e sangue,
são tempos de espera,
de espera.
quarta-feira, 3 de junho de 2009
Os Bagateleiros da bagatelas
Não vou delongar este diálogo dos dois. Basta visitá-los.
Fazer a Bagatelas foi por demais para a minha pessoa. E depois de quase três anos, quem sabe dá para fazer uma síntese sobre o que foi a Bagatelas! (claro que é minha ótica, outros participantes dessa história também possuem seus prismas de visão).
A ÁRVORE
Em frente uma árvore me olhou,
robusta e desgrenhada
sua sombra me envolveu
como o útero de minha mãe sorrindo
e disse: esta rua é minha,
aqui tem grito e desatino,
reza e menino órfão,
nao tem manga nem pitanga,
tem flores na esquina,
gato pardo e restaurante chinês.
Nesta rua do alto vejo tudo
e sem estricnina ou outra ina
beijo tua mulher na varanda.
Naquele instante embasbaquei
e a abracei com o mundo
de meus braços.
terça-feira, 2 de junho de 2009
AMIGO NOTURNO
tem uma vozinha que arfa, esparsa e arfa.
Ela mistura-se ao princípio do sono, fio
engasgado que ilumina as ruas de Orfeu.
Assustado, desabo na cantilena da vozinha
e me vejo inquirido e culpado, desastrado.
Em horas, a vozinha nutre um corpóreo
malsão feito de carapinha e dentes cariados
e soçobram ao lado da cama os restos de cinzas,
flores e dissabores de um dia já apagado
e mal-vinda a noite que amanhece
é ali que ela me esclarece as pálpebras
e os segundos que passo vendo
escuro diante dos meus pesadelos.
domingo, 31 de maio de 2009
PEIXE DE AQUÁRIO
paciente, escondido num pequeno
coreto de corais. Vi, só eu o vi.
Só eu vi suas bolhas
sonoras atraindo outros peixes
menores. Solitários.
Veio um que só eu vi. Atraído
pelas bolhas veio
escorregando as escamas,
deslizando por entre crustáceos.
Os olhos opacos dos dois peixes
se destacaram quando
se encontraram.Um aflito e esquivo.
O outro seco e esquizo, esguio.
Era meio-dia, quando meu amigo
olhava o mundo pela janela e gritou:
Mundo louco esse! Olha lá!
Um pivete acabou de esbofetear um camarada.
Deixa pra lá, eu disse, enquanto
assistia, no meu aquário de relaxamento,
meu serial killer predileto.
sexta-feira, 29 de maio de 2009
Fernando Pessoa - Que espécie de Homem sou...

Cumpre-me agora dizer que espécie de homem sou.
Não importa o meu nome, nem quaisquer outros pormenores externos que me digam respeito. É acerca do meu carácter que se impõe dizer algo.
Toda a constituição do meu espírito é de hesitação e dúvida. Para mim, nada é nem pode ser positivo; todas as coisas oscilam em torno de mim, e eu com elas, incerto para mim próprio. Tudo para mim é incoerência e mutação. Tudo é mistério, e tudo é prenhe de significado. Todas as coisas são «desconhecidas», símbolos do Desconhecido. O resultado é horror, mistério, um medo por demais inteligente.
Pelas minhas tendências naturais, pelas circunstâncias que rodearam o alvor da minha vida, pela influência dos estudos feitos sob o seu impulso (estas mesmas tendências) — por tudo isto o meu carácter é do género interior, autocêntrico, mudo, não auto-suficiente mas perdido em si próprio. Toda a minha vida tem sido de passividade e sonho. Todo o meu carácter consiste no ódio, no horror da e na incapacidade que impregna tudo aquilo que sou, física e mentalmente, para actos decisivos, para pensamentos definidos. Jamais tive uma decisão nascida do auto-domínio, jamais traí externamente uma vontade consciente. Os meus escritos, todos eles ficaram por acabar; sempre se interpunham novos pensamentos, extraordinárias, inexpulsáveis associações de ideias cujo termo era o infinito. Não posso evitar o ódio que os meus pensamentos têm a acabar seja o que for; uma coisa simples suscita dez mil pensamentos, e destes dez mil pensamentos brotam dez mil inter-associacões, e não tenho força de vontade para os eliminar ou deter, nem para os reunir num só pensamento central em que se percam os pormenores sem importância mas a eles associados. Perpassam dentro de mim; não são pensamentos meus, mas sim pensamentos que passam através de mim. Não pondero, sonho; não estou inspirado, deliro. Sei pintar mas nunca pintei, sei compor música, mas nunca compus. Estranhas concepções em três artes, belos voos de imaginação acariciam-me o cérebro; mas deixo-os ali dormitar até que morrem, pois falta-me poder para lhes dar corpo, para os converter em coisas do mundo externo.
O meu carácter é tal que detesto o começo e o fim das coisas, pois são pontos definidos. Aflige-me a ideia de se encontrar uma solução para os mais altos, mais nobres, problemas da ciência, da filosofia; a ideia que algo possa ser determinado por Deus ou pelo mundo enche-me de horror. Que as coisas mais momentosas se concretizem, que um dia os homens venham todos a ser felizes, que se encontre uma solução para os males da sociedade, mesmo na sua concepção — enfurece-me. E, contudo, não sou mau nem cruel; sou louco, e isso duma forma difícil de conceber.
Embora tenha sido leitor voraz e ardente, não me lembro de qualquer livro que haja lido, em tal grau eram as minhas leituras estados do meu próprio espírito, sonhos meus — mais, provocações de sonhos. A minha própria recordação de acontecimentos, de coisas externas, é vaga, mais do que incoerente. Estremeço ao pensar quão pouco resta no meu espírito do que foi a minha vida passada. Eu, um homem convicto de que hoje é um sonho, sou menos do que uma coisa de hoje.
quinta-feira, 28 de maio de 2009
EVENTOS E LANÇAMENTOS


segunda-feira, 25 de maio de 2009
EXERCÍCIO POÉTICO
no colo do meu corpo
me desafio conhecer
estas paredes que me narram
no centro das vigas e no visgo
do concreto sem poros.
Por ora assisto o desfolhar
dos cupins expondo o estertor
do mofo e do aniquilamento
no armário e nos lençóis,
enquanto na janela do quarto
um black-out estendido
derrete as cinzas de sol
e esconde para além
o além dos meus pensamentos.
sábado, 23 de maio de 2009
MONTEZ MAGNO
No álamo, no páramo
e nas proximidades do terceiro ventríloco
e do sulco que os separa,
acham-se importantes núcleos do sistema.
Aí se encontram
os centros térmicos do sonho.
Ao lado deles, os centros voluntários,
cuja artificial mecânica
provoca atividades em várias regiões,
surgindo assim as descargas elétricas
e as visões oníricas, poéticas.
CINCO MOMENTOS DE UM PÁSSARO NOTURNO
a San Juan de la Cruz
Cinco momentos cobrem sua exatidão:
primeiro há de vir sereno na passagem,
pois o que é brusco perde a espontaneidade;
em seguida se instala intacto e atento,
os olhos repetindo sinais de sua presença;
logo abarca o mundo mas não anuncia;
só então se lança em vôo que subverte
as dimensões do dia, recolhe a aparência
Por fim alterna a sombra em luz, mas não revela
que o pouso foi completo. Incólume, se retira
Poemas extraídos do livro Narkosis, 2º edição ampliada, Olinda - 1981
sexta-feira, 22 de maio de 2009
Chuva Fina

hoje, ela estará na rádio manguinhos 13:00!
[Fernando Pessoa]
Cai chuva do céu cinzento
Cai chuva do céu cinzento
Que não tem razão de ser.
Até o meu pensamento
Tem chuva nele a escorrer.
Tenho uma grande tristeza
Acrescentada à que sinto.
Quero dizer-ma mas pesa
O quanto comigo minto.
Porque verdadeiramente
Não sei se estou triste ou não.
E a chuva cai levemente
(Porque Verlaine consente)
Dentro do meu coração.
quarta-feira, 20 de maio de 2009
INDECISOS - GUSTAVO DO CARMO

Estes Indecisos, de Gustavo do Carmo, se inserem no híbrido que existe entre a crônica e o conto. São doze histórias que transitam na urbanidade e no âmbito familiar, através de personagens e enredos variados, cujos enlaces e desenlaces se desenvolvem harmoniosamente por cada página do livro. O tema central, como próprio título sugere, é a indecisão, a encruzilhada, o momento em que o fio de lã puxa pelas duas pontas. Embora a temática reflita um processo natural do humano: a dúvida e o medo do acerto, as opções narrativas encadeadas pelo autor apontam para a simplicidade tanto na abertura quanto no fechamento dos textos, aliás, estes nos trazem surpresas agradáveis.
Em Indecisos, conta de abertura, a indecisão é nomeada claramente na escolha do nome do filho de um determinado casal. Os pais não conseguem se decidir sobre qual nome. O fato é anunciado ao leitor logo no primeiro parágrafo do conto: “(...) A terceira foi escolher o nome da criança. Durante a gravidez, pensou em vários nomes masculinos e femininos; Rafael, Marcos, Ricardo, Roberto, Reynaldo, Ronaldo, Flavia, Luciana, Marcela, Daniela... Como nasceu um menino, Arnaldo Augusto optou, pelo menos, em começar o nome com a letra R.” A pendenga da escolha do nome da criança desdobra-se na história para a confusão da troca de nomes da esposa de Arnaldo Augusto e de sua antiga namorada. A assim por diante, durante toda a história surgem dúvidas nos pensamentos do protagonista.
Uma das marcas impressas nos contos é a ironia. Gustavo a trabalha bem. Sabe empregá-la de modo sutil, sem exageros. É através dela que ele dita o ritmo das histórias. A percebemos quando a dúvida original da primeira história se mantém e se perpetua, levando o protagonista a não resolve-la, complicando ainda mais a história. Mas o que podemos esperar de um personagem que se chama Arnaldo Augusto, senão um complexo de duplicidades, enganos, dúvidas. Até nisto o autor se propõe montar o conjunto de sua literatura de modo completo.
O mosaico literário de Indecisos é direto. Neste ponto, caro leitor, você não terá muitas delongas e/ou digressões. A narrativa de Gustavo é concentrada, é cinematográfica. O autor não inventa, atém-se a história, pois é esta sua ocupação e o faz. Este precioso detalhe traz leveza aos contos. Assim, podemos ir de uma história a outra sem perdermos o sentido maior da obra, a indecisão.
Tanto o tempo quanto o cenário são duas ferramentas bem administradas. No caso do tempo chega a ser instigante como o autor o utiliza. Constantemente abrindo perspectivas novas (o tempo é um dos responsáveis pelos efeitos suspensivos que temos ao ler cada texto). Em diversos contos do livro, os narradores e os personagens refazem suas vidas, buscando nas reminiscências as saídas para seus conflitos. Sim, é recurso clássico, mas bem feito. No conto Com muito orgulho! O tempo é tão presente que se transmuta nas duas equipes de futebol: o time presente e o time futuro. Há o jogo. Há o tempo: 46 minutos da segunda etapa. Há o árbitro, o nosso protagonista que refaz em segundos o percurso de sua vida: “Lembrou dentro de uma cestinha de vime, na porta de ferro vazada, protegida por um vitral azul de um casarão. Ele, bebê, protegido por uma manta de lã branca. Não havia um único bilhete. Nem uma única mamadeira. O recém-nascido chorava de fome.”
Por último vale ressalvar que Gustavo tem pleno domínio de sua técnica de criação. Este seu segundo livro nos faz ansiar pelo próximo e desejar novos vôos, novas investidas na literatura. No mais, caro leitor, o que vale mesmo é passar decididamente este página e iniciar a leitura dos contos.
Boa leitura!
terça-feira, 19 de maio de 2009
Nas margens do rio
Do outro lado existem árvores com jeito de esquecidas, suas folhas caídas emolduram o tronco. Em algumas, as folhas descem da copa como uma massa amarronzada ou areia movediça, acúmulo de húmus, de vermes, de minhocas, de vida, mas não uma vida sólida, embora consistente, apesar de líqüida também, uma vida espessa que se expande pelas árvores e se mistura ao solo. Vida esquiva e escorregadia.
Há na largura de uma margem até a outra uma medida que não se escandeia por ninguém, só por aqueles olhos, únicos olhos presentes no ato e no dia desconhecido. Olhos cheio de artérias saltando por fora das pupilas. No meio, pulsando velozmente, passa o rio que ele não sabe onde nasce, nem onde finda. Mas do lado em que ele se posta de cócoras num movimento encarquilhado cheio de curvaturas, ele tenta auscultar com a vista a longa passagem que se delineia de um ponto que vai giratoriamente o circulando, colocando-o no centro de tempo sem sol. Ele não visualiza o que está se descortinando por detrás da margem do rio movediço porque não está consciente, porque neste momento ele é ausência, vácuo e ponto suspenso. É sono. E balança na cama de um lado para o outro lentamente, como se estivesse em um barco deslizando pelo rio, sendo ninado. Sonhando.