Para nossa ciência, o parlamento português aprovou o acordo ortográfico que prevê a padronização de nosso idioma nos países lusófonos. O documento encontrava e ainda encontra grande resistência em Portugal porque centenas de palavras têm de passar a ser escritas com outra grafia. A proposta prevê, entre outras coisas, que a grafia das palavras seja mais próxima da pronúncia por meio da remoção de consoantes mudas, como no Brasil. Já o alfabeto aumenta de 23 para 26 letras, com a inclusão oficial do "k", do "w" e do "y". O acordo também determina novas regras para o uso de hifens e acentos.
A resistência portuguesa se escora em escritores e personalidades que consideram o acordo como uma espécie de "rendição desnecessária à influência brasileira". Uma petição foi enviada ao parlamento de Portugal para protestar contra a reforma ortográfica que busca unificar o português, segundo afirmaram os promotores da iniciativa. A língua é o idioma oficial em oito países. Um abaixo-assinado, com mais de 33 mil assinaturas, foi entregue ao presidente da Assembléia da República de Portugal, Jaime Gama, com "vários informes e documentos que demonstram as fragilidades técnicas, científicas e políticas do acordo (unificador)", declarou o primeiro signatário do manifesto, o deputado europeu e intelectual Vasco Graça Moura. Além dele, escritores do calibre de Antônio Lobo Antunes defendem a revisão do acordo. Já os articulistas das mudanças alegam que a padronização facilitará buscas na internet e uniformizará termos jurídicos para a elaboração de contratos internacionais. O governo português tem a esperança de que, com a padronização, o idioma finalmente se torne uma das línguas oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU). Atualmente, a ONU tem seis idiomas oficiais: o árabe, o espanhol, o francês, o inglês, o mandarim e o russo.
O novo acordo ortográfico foi firmado em 1990, entre Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. Deveria entrar em vigor três anos mais tarde. Mas, até o momento, só o Brasil, Cabo Verde e o arquipélago de São Tomé e Príncipe ratificaram a decisão.
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Pesquisando na internet pude observar várias mensagens e matérias contrárias ao acordo, sobretudo por parte da comunidade lusitana. Quando se fala, se pensa e se escreve em uma língua utilizamos um código padrão para que todos os falantes daquele idioma compreendam a mensagem em questão, seja uma bula de medicamento ou um jornal. Mas, com relação à língua portuguesa há facetas inusitadas que não dizem respeito somente a consoante [c] presente, por exemplo, nas palavras acção e actual escritas no antigo idioma da península ibérica.
Uma das questões diz respeito à semântica, a polissemia das palavras. Neste ponto, realmente é difícil estipular um padrão comum de compreensão. Quando se trata de literatura, principalmente a brasileira e a portuguesa, o uso do idioma se distancia. Leia Guimarães Rosa ou Joaquim Paço D’arcos ou José Saramago. Na obra desses autores o universo semântico, as possibilidades polissêmicas são inúmeras, criam outros prazeres à absorção do sentido do texto. Entretanto, o Guimarães Rosa é brasileiro e eu também o sou e mesmo assim a dificuldade para compreensão é enorme. Será então que escrevemos em idiomas diferentes? Acho que o nodal é a particularidade da escrita, que através do acordo poderá criar algumas planificações que não implicam semanálises, apenas mudanças do caráter ortográfico.
Nós brasileiros sempre nos referimos ao nosso idioma como Língua Portuguesa. Aprendemos assim na escola. No ensino fundamental, médio e universitário, a língua estudada, aprendida e apreendida não se chama língua brasileira ou o “português brasileiro”. Aspecto este difícil para muitos lusitanos que teimam em imputar e nomear nossa língua como genuinamente brasileira, o que certamente os diferencia e lhes dá caráter único.
Com o acordo ortográfico, este e outros mitos caem totalmente, ainda mais se levarmos a conta de que a adequação teve por base os hábitos da terrinha de cá, o que arrefece os idílios e as vaidades intelectuais portuguesas, pois lá, além de uma crença de propriedade intelectual da língua de Camões, existe uma concepção de que o falar e o escrever na Ibéria são a forma mais correta e apropriada da Língua Portuguesa. De certa forma, esta é a postura apresentada na petição contra a ratificação do acordo.
Bem, ainda pretendo retomar este tema em próximas postagens.
5 comentários:
Olá, Flávio
Acho que essa história ainda dará "muito pano para mangas". Quem viver, verá.
Beijos.
Sylvia Regina Marin
P.S.: Adorei seu blog.
Flávio.. é um prazer ler você.Fez um ano que tive o prazer de receber sua gentileza na Travessa. E seus escritos revelam sua forma de ser. Um beijo carinhoso e duas surpresas. A Sylvia que comentou acima é uma amiga pessoal minha e a segunda é que vem novidade em setembro. Rosa Pena
Também adorei o artigo, especialmente na parte que diz respeito a falarmos todos a mesma língua, ainda que com tantas variações.
Finalmente um blog bom de ler, com muita informação.
Obrigado e parabéns
Flá, que confusão isso ainda vai dar... Adoro actual, rs... tenho paixão por essas variedades de uma mesma palavra que refletem uma forma de ser e sentir. Acho cada palavra tão especial que deveria ter milhares de jeitos de escrever. Ela, êla, elá... poxa... se a gente pode complicar, pra quê simplificar? Seus posts também chegam bonitinhos pra mim... Leio você todo dia!
Ah! Dia 19 de junho estou invadindo o Rio!
Um beijo! Tati
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